domingo, 18 de novembro de 2012

Pearl Jam é trampa

Parabéns pelo nascimento do teu filho. Sim, apesar de tudo e mais alguma coisa, ser pai é a melhor coisa do mundo e ainda bem que finalmente podes experimentar essa sensação. Quero dizer-te que não foi tarde demais ter sido pai pela primeira vez aos quarenta anos, ainda hás-de ter certamente muito para viver e o que te faltar em energia durante o crescimento do teu filho, podes compensar com experiência de vida. Até porque hoje em dia, casar aos vinte e quatro anos e ser pai aos vinte e cinco, como eu, é considerado como ainda "muito cedo". Compreendo as tuas hesitações, mas conhecendo-te como eu te conheço, tenho a certeza que vais ser um óptimo pai, talvez até melhor que eu.
Agora, se eu te puder prevenir de alguma coisa, digo-te que por muito aberto, compreensivo, presente e razoável que tu julgues ser no teu exercício de paternidade, o mais provável é que o teu filho acabe por achar que és tudo menos isso. Olha a minha mais velha, a Bárbara.
No alto dos seus quinze anos, eu sou o pai mais careta que há. Para a minha filha, ter crescido num mundo sem internet e TV por cabo é o mesmo que ter crescido na Idade da Pedra e os Pearl Jam são tão arcaicos como os Pink Floyd. Para a minha filha, eu não faço ideia do que é actual e fixe e tudo o que eu lhe digo parece vindo de uma realidade virtual. Para a minha filha, sou um chato que está  sempre a dar-lhe sermões sobre os perigos da droga, do álcool e do sexo desprotegido porque eu acredito que ela é uma tótó que à mínima pressão, irá fumar ganza ou beber desalmadamente ou deitar-se com qualquer chico-esperto que lhe fizer falinhas mansas. Para a minha filha, as minhas objecções àquilo que ela veste são um atentado à sua individualidade e uma tentativa opressora de a formatar ao autómato acéfalo e obediente que eu alegadamente quero que ela seja. Para a minha filha, eu implico com ela apenas por inveja de eu já não ser jovem e despreocupado e não lhe deixo aproveitar o imenso tempo livre de que ela dispõe agora (bem basta mais tarde!). Para a minha filha, tudo o que ela faz nunca é suficientemente bom, nunca lhe dou elogios correspondentes aos esforços dela na escola, em casa, no voleibol e em tudo o mais. 
E na verdade, ela tem razão. Aos quinze anos, também eu era um adolescente respondão, insubordinado e incompreendido e tinha a certeza que o meu pai não fazia a mínima ideia do que eu estava a passar e só estava a ser um chato de primeira só porque sim. Mas o que sabia eu aos quinze anos? Não tinha nenhuma geração seguinte para poder comparar, não sabia ainda que os sermões martelados na minha cabeça contribuíram para que as minhas maluquices não resvalassem por caminhos pouco saudáveis, não fazia ideia que assim que te tornas adulto e entras no mercado de trabalho, não tens elogios pelos teus esforços, se é que tens algum elogio pelo quer que seja! Só agora eu sei disso e posso dar valor ao meu pai. Por isso não me importo que a Bárbara me ache um pai careta. Provavelmente, assim que ela crescer um pouco mais, há de perceber que foi tudo para o bem dela.
Mas enquanto a Bárbara não sai desta fase tão adorável, vou tentando aproveitar os últimos momentos da Sofia antes que seja a vez dela de passar por esse rito de passagem que é abominar os nossos pais aos quinze anos. Não tarda ela vai deixar de ter bonecos de peluche no quarto e de sonhar em casar com um membro de alguma boysband da moda e vai dizer-me também a viva voz que "Pearl Jam é trampa!". Das cólicas, insónias, xixis e cocós dos primeiros anos às respostas enxofradas de insensatez dos 15 anos, faz parte da vida estes cadilhos dos nossos filhos. A nós pais resta fazer o melhor que sabemos, mesmo que para isso tenhamos de ser o menos fixes possível.

Sem comentários: