segunda-feira, 21 de março de 2011

A Chave do Cadeado

Devia ter a tua idade quando resolvi fechar o meu coração, ou pelo menos, os compartimentos mais secretos. Talvez por algum desgosto do qual já não recordo rosto ou guião. Só sei que a partir de então, decidi que as mulheres não seriam para mim mais do que albergues de pernoitas, ora agradáveis ora convenientemente esquecidas.
Como não sou feio nem nunca fui parvo, tive quantas eu quis. A maioria jogava pelas minhas regras mas muitas acalentaram a esperança de encontrar a chave do meu cadeado mais cerrado. E pelo menos com duas ou três, cheguei a ter vontade de me mostrar de coração aberto. Mas fosse por orgulho, por conforto ou medo, não o fiz.
Agora tenho quarenta e quatro anos e encontro-me a desfrutar do teu corpo, vinte anos mais novo que o meu. E de repente, o papel do amante frívolo já não me parece tão apetecível. Fosse eu mais novo, e talvez te dispensaria com a facilidade de outras aventuras. Mas tiveste a sorte de me apanhar com esta idade, onde olho para trás e vejo tantos espaços em branco na minha vida. Chego-me a arrepender de não me ter entregado a quem eu mais quis; talvez saísse bastante magoado mas assim, podia não sentir como se algo me tivesse passado ao lado.
Será talvez por isso que me custa desembaraçar de ti. Continuo a aceder aos teus apelos, aos teus olhos de jade, ao teu corpo esculpido a cinzel, ao teu riso garoto.
Tu gostas de mim porque és daquelas raparigas mais velhas que os seus anos, para quem os rapazes da tua idade não passam de miúdos imaturos e incipientes. Para quem homens mais maduros são um interesse mais intrigante. Agora tu julgas que eu sou o máximo, tudo o que achas que um homem deve ser: maduro, sábio, atencioso, responsável e hábil. Mas não me admiro se daqui a pouco tempo, tu te perdesses de amor por um tipo novo e bem mais giro que eu, e deixasses este velho no mesmo impulso que te levou a aceitares a minha conquista.
Mas ainda assim, minha bela, desta vez não quero rédeas. Só se vive uma vez, e sem viver de coração aberto, fica apenas uma vida meio vivida.    

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